Testemunho

“Vai haver sempre uma porta aberta para o profissional que se destacar” – Marlene de Sousa

 

Marlene

Marlene de Sousa tem 26 anos e é de Quelimane. É uma profissional formada em Relações Internacionais, Direitos Humanos e Recursos Humanos. Em 2014 criou uma associação chamada Karingando para ajudar crianças carenciadas a nível da educação, recolhendo material escolar à porta de papelarias e doando-o a instituições. Agora, Marlene tem uma empresa – a Attitude – que treina e prepara jovens dos 18 aos 30 anos para o mercado de trabalho. Sentamos com ela para saber quais são as características de um bom profissional, se há ou não valor em fazer estágios e como é que os jovens podem melhor preparar-se para entrar para o mercado de trabalho.

Podes falar-me do teu percurso? Como é que foste parar em Recursos Humanos?

Estive a trabalhar numa empresa durante nove meses e foi nessa empresa que aprendi tudo o que sei hoje. Entrei como estagiária e como era muito curiosa fazia um pouco de tudo. Fui a reuniões em que ouvi as pessoas a dizerem ‘queremos trabalhar com jovens mas o jovem moçambicano é preguiçoso’. Uma vez uma dessas directoras disse ‘os jovens moçambicanos não têm atitude’ e virou-se a dizer que não estava a falar de mim. Foi chocante porque eles falavam de uma forma genérica, e eu também sou uma jovem moçambicana e não concordo com isso. Aquilo ficou-me na cabeça e perguntava-me ‘o que é isso?’. Eles pegavam num CV  e diziam ‘olha, não sabem escrever um CV, não sabem comportar-se numa entrevista’ e eu dizia ‘então porque é que não formam?’, ‘não temos tempo nem disponibilidade, queremos pessoas preparadas’, diziam.

Deixei o meu emprego porque sempre quis ser independente e a independência seria criar um negócio. Fui trabalhar com o meu pai durante quatro meses num distrito, no sector de construção civil. Continuei a trabalhar em part-time para a empresa que tinha deixado durante dois meses, até ver que não funcionava. Em Mocuba, onde estava, aproveitei para juntar dinheiro para começar o meu negócio e quando voltei criei, com a Raquel Carrilho e a Elma, a minha empresa.

A Atitude queria actuar em recursos humanos e responsabilidade social. Acabamos por tirar responsabilidade social porque não sabíamos como é que lidaríamos com isso. Tentámos perceber o que é que o mercado está a precisar e decidimos focar-nos no nosso propósito de cinco anos: pegar em jovens, dos 18 aos 30 anos, com menos de 3 anos de experiência e capacitá-los no sentido de estarem preparados para o mercado de trabalho. Já todos têm em comum uma formação, mas quem fará a diferença é aquele que tiver iniciativa, que tiver melhor preparação, esse é que se destacará.

Falta mesmo atitude aos jovens?

Acho que as pessoas deviam perceber onde é que estamos e as necessidades das pessoas. A maior parte das pessoas não tem condições e tem a ver com a base, as escolas estão muito longe, não têm cadernos, o ensino é o que é – não tem grande qualidade – e tudo isso se reflecte no que a pessoa vai ser como profissional. Se tiver boa educação pode ser um bom profissional. Não acho que os jovens não têm atitude, e com a experiência que tenho colhido ainda mais acho que não é por aí. Falta formação sobre tornarem-se competitivos, informarem-se mais, partilharem mais. Depois deste processo todo, descobrem que há atitude dentro deles.

Qual é a tua opinião sobre os estágios?

O que digo aos estudantes é que sempre que saem de uma formação académica ainda não têm propriamente um valor no mercado, feliz ou infelizmente. Os pais investem em nós e achamos que vamos ganhar dinheiro e o retorno é imediato, mas não. Só adquirimos teoria, precisamos de adquirir valor através da nossa experiência profissional, no contacto com a prática e vai ser nesse contacto que todos têm que aceitar o que aparecer. Se for um estágio remunerado, que seja; se não, estão a ganhar valor suficiente para depois dizerem ‘neste momento, com a minha formação e experiência o meu valor é este’.

E como é que um profissional se distingue dos outros?

Para estarem preparados devem adquirir conhecimentos para estudar o contexto, conhecer o mercado, as empresas, as exigências. Quem estiver melhor informado em relação às perspectivas e exigências no mercado, em relação à concorrência. Informação e curiosidade: quem for curioso conseguirá ajustar a sua postura ao mercado. E, também, vai haver sempre uma porta aberta para o profissional que se destacar, que tiver as competências que os outros profissionais não têm. Vai arranjar emprego aquele que mostrar ao empregador a mais-valia em o contratar e brilhar.

Qual é a tua maior realização até ao momento?

A minha maior satisfação é ter colocado jovens que passaram pela minha formação no emprego onde actualmente estão. Fazer o acompanhamento desde o início, de estudantes que descreviam-se como indisciplinados para profissionais pontuais e super competentes e depois receber mensagens deles a anunciarem premiações dentro das empresas.

E o que é que a Attitude pretende continuar a fazer?
Estamos focados em inovar os nossos serviços, com preparação para entrada no mercado de trabalho, conceder as ferramentas para isso, como fazer o CV, a postura na entrevista, e por outro lado um programa em que faremos dinâmicas de grupos, que é uma das fases do processo de selecção nas empresas e daremos orientação profissional.